Atualmente tem dia de comemorar tudo, ninguém fica de fora. Aproveitando que hoje é o dia dos avós, encontrei uma boa oportunidade para falar um pouco sobre as minhas vivências.
O relógio da copa soava um barulho que eu nunca entendia: não conseguia identificar as horas só de ouví-lo tocar.
Eu ficava deitada no quarto da casa dos meus avós só observando o que era diferente da minha casa. Era um grande evento o dia que íamos dormir lá. Tudo parecia muito mais legal e muito mais gostoso. Não sei porque não ficávamos lá mais vezes: sempre me perguntava. E eu mesma concluía que perderia a graça se aquilo virasse rotina, se fosse todo dia. O gostinho de quero mais tinha que ficar na memória.
E o relógio? Este foi o que mais me encucou durante alguns anos. Eu queria descobrir por mim mesma como ele funcionava. Sempre adorei investigar as coisas, sobretudo quando criança. Adorava um mistério! E a casa da vovó era o lugar certo para isso!
De repente soou o relógio novamente…e eu contava as badaladas, só que eram muitas…. não podiam identificar só a hora. E eu percebia que, primeiro, tocava tipo uma música e depois as badaladas eram mais sérias e diretas, provavelmente indicando o horário real. Depois de pouco tempo soou novamente o relógio e eu pensei: “não podia ter se passado uma hora, foi rápido demais”. E naquela época parecia ter a vida inteira para observar pequenas coisas, brincar, fazer tudo aquilo que eu queria e mesmo assim o dia não acabava. Parece que o tempo passava mais lento do que atualmente….
Depois de um tempo, novamente o relógio deu sinal. Eu já estava querendo levantar do quarto e ir para a copa verificar o que estava acontecendo, mas os meus avós supostamente dormiam e eu não queria acordá-los cedo daquele jeito. Ai, não aguentei esperar e segui pé ante pé, abri as portas com bastante cuidado e cheguei na copa. Ufa, finalmente! Passei pelo corredor sem ser notada e quando cheguei na ……. – Bom dia, vô! Que horas são?
São nove e quarenta – respondeu o vovô- e eu achando que eram seis horas da manhã ainda. E logo o relógio tocou novamente, na minha frente marcando nove horas e quarenta e cinco minutos. Agora o som era mais longo. Eu olhei para ele e, com uma cara um pouco assustada e um pouco desconfiada, tomei meu leite com nescau enquanto prestava atenção naquele objeto, ansiosa por entendê-lo. E foi assim que passei a parte da manhã daquele dia. Ai perguntei para o vovô e ele me disse que além das horas, ele tocava também uma música e que tocava várias vezes no período de uma hora. Hum, eu estava começando a entender, mas não queria a resposta completa, a graça era ir juntando as pistas e descobrir. Como estava de férias ali, teria alguns dias até concluir a pesquisa.
E assim foi: eu ficava olhando para o relógio e contando as badaladas de cada hora, anotando: eu estava criando alguma estratégia, enquanto as meninas brincavam com a bola lá no quintal. Logo a vovó me mandou ir para o quintal também para brincar ao ar livre enquanto limpava a copa e colocava a mesa do almoço.
E então fui para lá brincar com minhas irmãs e com o Sidney. Era um moço que trabalhava lá e que ficava catando as bolas que a gente isolava propositalmente no telhado. A brincadeira era justamente essa: isolar a bola para ele ir buscar e era diversão garantida para ele e para a gente!
Ah, e aí chegou a hora do almoço: eu consigo sentir direitinho o aroma da comida e lembrar do sabor: o feijão batido com arroz, o lombo, a batata palha fritinha na hora. Tudo preparado pela Ingrácia. A gente nem precisava se preocupar com gordura, colesterol, açúcar e outras maldades que existem hoje….. Parecia que tudo tinha um cheiro e um gosto especial e diferente. A sobremesa também era muito esperada: a gelatina cor de rosa. Na época parecia coisa de outro mundo: era A gelatina da casa da minha avó. Depois de anos fui descobrir que nada mais era que uma gelatina comum com leite condensado. Bem engordativa para os padrões atuais.
E voltando ao relógio eu descobri no final das férias: ele tocava de quinze em quinze minutos parte da música de acordo com o que o relógio marcava. Então ficava assim: quinze minutos tocava um quarto da música, meia hora tocava metade da música, quarenta e cinco minutos tocava três quartos da música. E quando era uma hora completa, o relógio tocava a música toda e em seguida as badaladas referente à hora que marcava. Complexo, né?
Foram alguns dias das férias passados da seguinte maneira:
Tinha um jardim de inverno na casa da vovó com um aquário com pintura de peixes e era um espaço bem legal, era mais decorativo do que propriamente para ser utilizado. Porém, a gente inventava de fazer esse aquário de piscina. Adivinha de quem era a ideia?
A vovó não gostava muito de tal ideia….. na verdade, ela ficava quase louca quando via a gente entrando lá dentro. O que importa é que o vovô liberava! E naquele calor a gente enchia de água e entrava lá com a mangueira de calcinha e touca de banho! Era uma farra só. Bons tempos!!
Outro momento especial era o passeio de carro com o vovô no Opala vinho com o freio de mão no volante. Era o máximo! E sabe para onde adorávamos ir? Para o supermercado. O CB Merci e outro que não me lembro o nome. Ele deixava a gente escolher as bobagens que nunca tínhamos em casa: então o que eu sempre escolhia era o Danette ou Chandelle. Achava fenomenal e algo fora do normal de tão gostoso. Era novidade e eu não tinha todos os dias em casa, só nas férias.
O vovô também arrumou uma forma de nos dar dinheiro, ou melhor, um trabalho para nos remunerar: pentiar o cabelo dele!!!
E no final da tarde, depois de assistir a sessão da tarde e de brincar na sala de costura da vovó aprendendo a costurar, a Ingrácia fazia o misto quente na misteira de lá e o pão de queijo enrolado à mão. Massa feita em casa: era assim mesmo! Nunca comi um misto tão gostoso, ficou guardado na memória. Nem hoje existem misteiras que fazem tal sanduíche tão gostoso quanto os da vovó. E os pães de queijo congelados que comemos hoje em dia não substituem nem de perto o gosto dos daquela época e nem trazem de volta esses momentos preciosos.
Respostas de 3
Nossa Isa, me deu saudades….queria que a Sofia fosse mais para casa dos avós, mas a gente fica com medo de dar trabalho….
Isa,os momentos mais felizes da minha infância foram na casa dos meus avós.Bons tempos!!!
Lu, traga suas histórias também! Serão super bem vindas!!